A realidade das escolas estaduais
000
Fui Professor Eventual de Matemática em diversas Escolas Estaduais na capital do Estado de São Paulo assim que terminei a Licenciatura Plena em Matemática. Uma das exigências para ter tal diploma era ministrar ou acompanhar aulas de Matemática e, terminada a carga horária mínima, por lá mesmo fiquei como Professor Eventual.
Uma vez que tinha que elaborar um trabalho de conclusão de curso, permaneci por lá, na primeira Escola, por mais de seis meses. Qualquer Professor Efetivo que porventura faltasse era, então, por mim substituído. Os alunos não entendiam como na aula de História ou Português, por exemplo, podia entrar um Professor de Matemática no lugar e pretender ensinar Matemática (uma das matérias mais odiadas pelos discentes). Tentei convencê-los de que era uma oportunidade única poder tirar possíveis dúvidas ou ouvir uma explicação do mesmo capítulo por outro ponto de vista ou forma de apresentação, mas nada surtia efeito.
Na cabeça dos alunos, se um professor faltou, por qualquer motivo que seja, eles deveriam ter o direito de fazer algazarra, se possível na quadra de esportes. Afinal iam passar de ano de qualquer forma e suas refeições estavam asseguradas, então, para que prestar atenção num Professor que nem era o deles.
Como tudo na vida tem dois lados e Isaac Newton talvez não imaginasse a extensão da sua terceira Lei, pedi licença ao Coordenador Pedagógico para experimentar usar de jogos em sala de aula. Afinal, por mais incrível que possa parecer, a grande maioria dos alunos de segundo grau não sabia localizar um ponto no plano cartesiano e como meu caderno de notas continha em suas primeiras páginas este joguinho, pensei na possibilidade de, por meio dele, ensinar a localização dos pontos no plano. Assim, aliadas a minha vontade de ensinar e a dos alunos de brincar, comecei a alinhavar o que hoje é uma parte do meu projeto de dissertação. Até alguns alunos vieram felizes me contar que estavam aprendendo a dominar este jogo.
Neste ínterim, fiquei sabendo de outra escola da região onde realmente havia necessidade de um substituto na área de Exatas e pedi à Diretora para mudar de estabelecimento de ensino. Encontrei nesta nova escola um problema ainda maior; a rebeldia era tanta que até jurado de morte eu fui e, belo dia, enquanto escrevia na lousa a matéria da aula, jogaram-me na cabeça um vidro de corretivo branco aberto.
Poderia ter machucado muito fisicamente, porém, minha cabeça e a malha que trajava ficaram completamente manchadas, manchas estas laváveis, porém, não o meu orgulho. Escrevi uma carta à diretora historiando o acontecido e enumerando os diversos crimes ali cometidos: desrespeito a funcionário público no comprimento de seu dever, conluio, formação de quadrilha, etc. Pedi, então, meu desligamento da instituição e, por sorte, uma das professoras da primeira escola me convidou a substituir uma colega que estava com a mãe muito enferma e eram aulas para E.J.A.
Na hora fiquei feliz por estar substituindo uma professora que realmente necessitava se afastar por certo período, era de Matemática e sendo para jovens e adultos achei que aqueles que trabalharam todo o dia e ainda iam estudar à noite teriam todo o interesse em aprender. Ledo engano. Não é que até pacotinhos de entorpecentes eu vi serem contados sobre a carteira. O desrespeito era tamanho que belo dia uma moça veio gritando de dedo em riste para mim. Sentindo-me impotente e triste, desisti de dar aulas eventuais para escolas do Estado.
Para não me envolver em política e gritar contra a progressão continuada, retornei novamente aos estudos. Usando dos ensinamentos da nossa bela LDB, multidisciplinarmente a estudos de psicologia cognitiva, pedagogia e outros para preparar-me para apresentar um projeto de mestrado em Ensino de Matemática que ainda me falta para poder ministrar aulas no terceiro grau e, quiçá, preparar nossos novos professores para esta sórdida realidade que senti na própria carne.
Como diz o velho ditado: “A esperança é a última que morre!”
Nenhum comentário:
Postar um comentário