EXAME DE ADMISSÃO AO DOUTORAMENTO
Quando eu era professor universitário, fui nomeado presidente de uma
comissão que iria examinar os candidatos ao doutoramento. Uma longa lista de
livros havia sido preparada com antecedência , livros que os candidatos deveriam
estudar. Aí no dia do exame eu tive uma ideia que submeti aos meus colegas e
eles concordaram. Em vez de inquirir os candidatos sobre ideias dos outros
escritas nos livros, ideias que nós já conhecíamos , por que não pediro que
eles falassem sobre suas próprias ideias? Falando sobre suas ideias teríamos
condições de conhecê – los melhor. Assim, quando o candidato passava pela porta
da sala de aula, trêmulo, esperando as terríveis perguntas sobre bibliografia ,
eu lhe pedia: “ Por favor, fale – nos sobre aquilo que você gostaria de
falar...” Pensei que isso seria uma felicidade: falar sobre aquilo que
pensavam! Foi não. Foi um choque. De tanto ler o que os outros pensavam, eles
se haviam esquecido daquilo que eles mesmos pensavam. Uma jovem entrou em
surto, achando que se tratava de um truque. Poucos tiveram ideias sobre o que
falar. O que nos levou a pensar que talvez seja isso que acontece: de
tanto ler as ideias dos outros , os
alunos se esquecem de que eles também podem pensar e que seu pensamento é
importante. Excesso de leitura pode fazer mal à inteligência. Com o que
concorda Schopenhauer: “ É o caso de muitos eruditos : leram até ficar estúpidos.
Porque a leitura contínua retomada a todo instante, paralisa o espírito...” E,
em oposição àqueles que ensinam leitura dinâmica , Schopenhauer afirma que a
leitura só é boa quando é bovina , quando leva à ruminação.
( RUBEM ALVES, in Ostra Feliz não
faz pérola, São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2008)
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