O ENEM NÃO É TUDO
Em inúmeros aspectos o Brasil é o país do “tudo ou nada”. Somos campeões ou “pernas de pau” e encaramos uma posição honrosa, ainda que não líder, como vergonha nacional. Adoramos o oitenta e execramos o oito, e jamais aceitamos que entre o branco e o preto, possa haver o bom senso do cinza. Essa nossa maneira extrema de ver as coisa, acabou fazendo com que o desempenho das escolas brasileiras no ranking do ENEM servisse para assinalar as “excelentes” e as que “não prestam” e não poucos são pais que questionam a mensalidade que pagam em escolas particulares, confrontando-a com outras, cujo desempenho dos alunos no ENEM tem sido mais auspiciosos. O que com esta crônica se busca destacar é que os resultados do ENEM são muito importantes, mas são extremamente frágeis e tímidos para que com o mesmo se possa aferir a verdadeira qualidade de uma escola.
Uma boa escola, tal como uma tradicional e comum cadeira de cozinha, se escoram em quatro pernas. Uma não é mais e nem menos importante que a outra e que, por acaso, uma delas se mostrar com defeito, a cadeira não se sustenta. A escola como um espaço de aprendizagem é uma dessas pernas e os alunos vão a mesma para aprenderem a aprender, para experimentar a alegria da pesquisa, a força da argumentação, a importância de uma visão sistêmica e não preconceituosa de mundo e, sobretudo, para que se afinem suas competências em acessar e associar informações, fazendo com que as mesmas sejam assumidas como pano de fundo da vida que se vive e se aprende e onde se busca conviver. Para essa finalidade escolar, a resultado do ENEM é expressivo e, dessa forma, é desejável que a escola possa sempre se destacar, jamais competindo por um primeiro lugar mas se posicionando com honra e firmeza.
Mas, a segunda perna da cadeira e assim uma segunda e importante função da escola é se constituir em um espaço de socialização, um lugar onde o aluno precisa aprender a compartilhar, fazer, preservar e engrandecer suas amizades. Escola que não fomenta essa oportunidade, atirando seus alunos a um pátio sem regras ou limites, pode bem adestrá-los para uma ação cognitiva, mas os está afastando de condições materiais e emocionais que dão dignidade ao ser humano. Não é fácil para uma escola ensinar a infinita dimensão da amizade e das relações interpessoais, mas é possível aprender e materializar no espaço escolar excelentes e admiráveis experimentos de relações humanas estudados e desenvolvidos em muitos lugares, em inúmeros países.
A terceira perna dessa imaginária cadeira é descobrir na escola suavocação para ensinar a significação e a dignidade do trabalho. Não se fala aqui de escolas profissionalizantes e da formação de técnicos, mas da verdadeira escola que ensina a importância e a grandeza da ação humana, verdadeiramente construtiva. Não se trabalha para ganhar dinheiro, ainda que o dinheiro possa ser conquistado pelo trabalho e não se trabalha pela honra de algum prestígio, ainda que existam serviços que tragam prestígio, mas se trabalha porque somos seres finitos e transitórios e que chegamos e descobrimos um mundo imperfeito que nos leva a consciência cidadã e ecológica de melhorá-lo e engrandecê-lo e sem o verdadeiro trabalho essa nobre missão não se conquista. Há no horizonte a que chamamos de futuro uma incontável multidão de pessoas ainda não nascidas, a espera de um mundo melhor que com esforço e solidariedade podemos ajudar a fazer. Se não é na escola que essa missão se aprende, não é imaginável onde é possível a mesma apreendê-la.
Mas, se a escola é importante como centro epistemológico, como espaço social e como fonte de aprendizagem do trabalho verdadeiro, sua sustentação se completa porque deve ser também um sítio que ensina a prática de valores. Honestidade, lealdade, responsabilidade, espiritualidade, alegria, liberdade, amor à verdade e a justiça, respeito ao outro, ética, coragem e muitos outros valores não são atributos genéticos e se não é na escola que se aprende e na família que se experimenta não se imagina como possa essas condições imergir e dignificarem quem quer que seja. Da mesma forma relações pessoais não é fácil colocar em prática essa missão, mas igualmente não pode representar obstáculo de superação difícil. Tal como professor que sabe muito dos conteúdos, mas em nada contribui para a dimensão humana de seus alunos não pode ser considerando um verdadeiro mestre, também uma escola que se conflagra em apenas ser bom espaço de aprendizagem de saberes programáticos e apenas acadêmicos é entidade incompleta, projeto inacabado. Vale tanto quanto qualquer cadeira de cozinha que tenta se sustentar em uma perna só
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