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1 de fevereiro de 2009

LI E RECOMENDO - PARA REFLETIR E DISCUTIR

Artigo Volta a quais aulas? André Haguette
31 Jan 2009 -
A volta às aulas é um acontecimento da maior importância para um país tão carente em educação formal e qualificação profissional, condições absolutamente decisivas para o desenvolvimento econômico, político e social. Voltar às aulas não pode ser um gesto somente quantitativo; deve ser um ato qualitativo. A elite cearense e brasileira já firmou o consenso que a escola básica particular é de qualidade e a pública não mostra qualidade já que os pobres não aprendem. Gostaria de mostrar que está representação é falsa e que o aluno carente e pobre aprende quando lhe é dada oportunidade. Costumeiramente, compara-se a escola particular com a escola pública, isto é, as escolas freqüentadas por classes econômicas e sociais opostas e antagônicas, o que reforça essa visão destorcida. Um aluno meu, Márcio Kleber Morais Pessoa, teve uma ideia diferente: comparar os rendimentos escolares de alunos da mesma classe social, no caso da classe sócio-econômica baixa, em duas escolas diferentes, uma particular, filantrópica e gratuita, a escola da Fundação Bradesco, e outra pública estadual, ambas localizadas em bairros pobres próximos. Assim, a renda mensal familiar de 21,62% dos alunos da Escola Bradesco é de até um salário, contra 13,33% da escola pública. E quais foram os resultados? Surpreendentes. Os alunos da Fundação Bradesco obtêm rendimentos semelhantes aos das escolas particulares de elite e, portanto, resultados muito melhores do que os da escola pública. Enquanto 90% dos alunos da Fundação Bradesco são aprovados, 70,3% o são na escola pública; 13,04% dos alunos da Fundação Bradesco já reprovaram alguma série contra 42,37% dos alunos da escola pública tiveram a mesma sorte; no Enem as notas dos alunos da Fundação Bradesco superam as dos alunos da mesma escola pública, etc. Esses dados e outros permitem concluir com toda tranqüilidade que não são os alunos que não podem aprender, mas que é a escola pública que é falha! E quais seriam os motivos que fazem da escola da Fundação Bradesco uma escola mais eficiente no aprendizado dos alunos pobres do que a escola pública? Márcio Kleber pesquisou e analisou diversas variáveis, tais como: o ambiente escolar, os tipos de gestão das escolas, a formação e carga horária dos professores, as relações e condições de trabalho, a disciplina escolar, o tempo letivo e a freqüência dos professores, etc. Não há espaço aqui para relatar toda a análise dos dados e as conclusões do pesquisador. Que seja suficiente notar que: apesar do ambiente escolar da escola pública não ser ruim, o da escola Bradesco propicia mais limpeza, higiene, conforto e estímulo ao aprendizado; enquanto a gestão da Fundação Bradesco adota um modelo racional, meritocrático, com eixo na definição das tarefas, no cumprimento das normas e na disciplina, a gestão pública opta pela participação, a cordialidade, o familiarismo e o “laissez-faire”; se a formação do corpo docente de ambas as escolas é equivalente, o ambiente de trabalho é diferente, um “cobra”, o outro “deixa correr”. Se a remuneração é maior na Fundação Bradesco, a escola pública oferece vantagens outras como a estabilidade, o pleno salário na aposentadoria, a lei do “quinto”, etc, que elevam o salário e a qualidade de vida dos professores; se o número de alunos por turma é menor na Fundação Bradesco, o tempo efetivo de ensino é menor na escola pública e as faltas e atrasos dos professores muito maiores. O compromisso do professor é cobrado na escola Bradesco, na escola pública, não. Um professor chegou a dar um conselho ao pesquisador: “Rapaz, emprego é em escola pública! Em escola particular você trabalha muito e recebe pouco! Você não tem estabilidade e vive com a corda no pescoço”. A pesquisa de Márcio Kleber Morais Pessoa indica claramente que o aluno de renda familiar baixa aprende quando a escola oferece condições. Ele é pobre, não é burro! É a escola pública que é deficiente no seu dia-a-dia pedagógico e administrativo. A monografia de Márcio Kleber, no entanto, aponta um rumo: o que a escola da Fundação Bradesco faz, a escola pública pode vir a fazer.
ANDRÉ HAGUETTE sociólogo haguette@superig.com.br
Obs: Publicado no Jornal OPOVO -

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